A PESQUISA EM FÍSICA NO PARÁ ¹

PESQUISA

A PESQUISA EM FÍSICA NO PARÁ ¹

Sob o aspecto técnico, existem problemas fundamentais a resolver na Amazônia, de cujas soluções dependerão seu desenvolvimento e sua independência. Destes, destacaremos os que reclamam soluções urgentes.

1. ENERGIA ELÉTRICA – Até o momento, a energia elétrica, tão necessária para o desenvolvimento industrial, vem sendo gerada, em parte, através do grande potencial hidráulico disponível na região, que é cerca de 77, 1 Gw ( ) (por exemplo, Usina de Comauna, parcialmente em funcionamento; Usina de Tucurui, em fase de construção). No entanto, quando não existe uma grande estrutura econômica-técnica-científica para obter energia através de outros meios como a fissão e fusão nucleares ou de plasmas (geradores magnetohidrodinâmicos), a exemplo dos países superdesenvolvidos, outras tentativas precisam ser feitas, em países que queiram aumentar seu potencial energético. Entre essas tentativas, encontram-se a energia solar e a energia geo-térmica ou aqua-térmica. Na primeira delas, procura-se captar a energia do Sol armazenando-a em usinas solares. No Brasil, existem pelo menos três projetos em andamento: na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), na Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e na Universidade de São Paulo (USP). Na segunda a energia poderá ser obtida através da variação de temperatura entre as várias camadas da superfície terrestre, quer na parte sólida, quer na parte líquida. Na UNICAMP existe um projeto, de inspiração francesa, cujo objetivo é o de captar a energia térmica que decorre da diferença de temperatura entre o rio Amazonas e seus afluentes.

2. TELECOMUNICAÇÕES – Até o momento, ainda não se consegue transmitir diretamente, através da troposfera, ondas de TV, de Belém, por exemplo, até Macapá ou Manaus. Pesquisas sobre a transmissão de ondas eletromagnéticas (OEM) através da troposfera vem sendo desenvolvida em vários países, principalmente no Japão, em razão de sua topografia. Os países ricos resolvem esse problema por meio de satélites artificiais de comunicações através de lançamentos próprios, ou pagando as transmissões. Os países menos ricos só usam satélites em eventos especiais. No Brasil existe um pequeno grupo de pesquisadores do Departamento de Engenharia Elétrica da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (DEE/PUC/RJ) que está trabalhando nesse problema.

3. PESQUISA E PROSPECÇÃO DO SUB-SOLO – Os últimos resultados a respeito da exploração de recursos naturais (minerais, petrolíferos, hídricos etc.) mostram que os métodos de prospecção de tais recursos mais utilizados e com melhores resultados, têm sido os geofísicos (elétricos, magnéticos, eletromagnéticos, gravimétricos etc.). Além do mais, é de extrema importância para a nossa região o estudo das propriedades elétricas e magnéticas das rochas, já que as mesmas são fundamentais para a caracterização de jazidas. Para desenvolver esse tipo de pesquisa a Universidade Federal do Pará (UFPA) já conta com um organismo específico: o Núcleo de Ciências Geofísicas e Geológicas (NCGG).

É claro que existem outros problemas a resolver na Amazônia, por exemplo, os de Saúde e de Agricultura, que, no entanto, remotamente se vinculam à Física, nossa área de interesse neste artigo.

A Física no Pará só adquiriu uma relativa independência em 1961 quando então passou a ser uma das divisões do Núcleo de Física e Matemática (NFM) na então Universidade do Pará (UPA), que acabara de ser criado. Logo depois, em 1962, um convênio firmado entre a então Universidade do Brasil (UB), hoje Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), convênio esse que teve como principais responsáveis o professor José Rodrigues da Silveira Netto, então Reitor da UPA e Carlos Alberto Dias e Jayme Tiomno então professores daquela Instituição. O referido convênio permitiu que fossem realizados estágios de professores da UPA no Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), e que, ainda alunos de nossa Universidade pudessem ser transferidos para a então Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade do Brasil (FNFi/UB) para concluírem o Bacharelado em Física. Naquele mesmo ano de 1962, o professor Curt Rebello Sequeira do NFM e dois alunos da Escola de Engenharia do Pará (EEP), Carlos Alberto da Silva Lima e Marcelo Otávio Caminha Gomes, seguiram para o Rio de Janeiro para dar início ao convênio acima mencionado. Essas pessoas juntamente com o professor Fernando Medeiros Vieira da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da UPA que já se encontrava fazendo estágio na Seção de Física Experimental do CBPF, sob a orientação do professor Horácio Macedo, constituíram os primeiros paraenses ligados à UPA a fazerem um curso de Física fora de Belém. Antes, em 1947, o professor Djalma Montenegro Duarte da então Escola Industrial de Belém (EIB) e também da EEP, fizera estágio nos Estados Unidos da América.

Com a ida do professor Jayme Tiomno para a Universidade de Brasília (UnB), em 1965, um convênio idêntico ao anterior foi firmado entre a UPA e a UnB, por intermédio de seu Instituto Central de Ciências (ICC) que tinha como Diretor o professor Roberto Aureliano Salmeron. Em conseqüência, outro professor do NFM, José Maria Filardo Bassalo, o aluno Antonio Gomes de Oliveira da EEP e três engenheiros recém-formados, Luís Fernando da Silva, José Augusto Dias e Antonio Fernando dos Santos Penna, seguiram par Brasília para fazer Bacharelado em Física. Desta vez, uma terceira instituição, o Centro Latino-Americano de Física (CLAF) que tinha como Diretor o professor Roberto Costa, colaborou com o convênio citado, fornecendo bolsas de estudo àquelas pessoas. Infelizmente a crise que ocorreu na UnB, naquele mesmo ano de 1965, provocou a interrupção da formação de especialistas em Física para a nossa Universidade. Só em 1968, o professor Bassalo seguiria para a Universidade de São Paulo (USP) para realizar a sua formação pós-graduada em Física (Mestrado e Doutorado), desta vez com auxílio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), que tinha como Coordenador o professor Libânio Pimenta.

Paralelamente a saída dessas pessoas ligadas à Universidade do Pará, alunos saídos do Curso Científico ou mesmo graduados em Matemática, seguiram para o Rio de Janeiro para fazer graduação na área de Física e Geologia com bolsas do Instituto Nacional de Pesquisas Amazônicas (IMPA), que tinha o professor Djalma Batista como seu Diretor.

A formação de pós-graduados em Física de nossa Universidade só seria reiniciado em 1971, quando o professor Aloysio da Costa Chaves, então Reitor da já Universidade Federal do Pará (UFPA), introduziria uma política global de capacitação de docentes da UFPA. Assim é que, mais uma vez com o auxílio da CAPES, três professores do já Departamento de Física da UFPA (DF/UFPA), Paulo de Tarso Santos Alencar, Leopoldino dos Santos Ferreira e Orlando José Carvalho de Moura, seguiram para o Departamento de Física da PUC/RJ (DF/PUC/RJ), para realizarem o Mestrado em Física. Em 1974-1975, no Reitorado do professor Clovis Cunha da Gama Malcher, mais quatro professores do DF/UFPA, José de Ribamar Seguins Gomes, João Sandoval Bittencourt de Oliveira, Luiz Sérgio Guimarães Cancela e Elsen Alfredo dos Santos Alencar, seguiram para a UNICAMP a fim de realizarem o Mestrado, desta vez com a colaboração tanto da CAPES quanto do Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq).

A partir de 1976, com a instalação do PICD/CAPES na UFPA, a formação de especialistas em Física tem seguido a política traçada pela Sub-Reitoria de Ensino e Administração Acadêmica da UFPA, por intermédio de sua Assessoria Técnica (ASTEC) e, dentro dessa política, existem quatro professores do DF/UFPA (Paulo Alencar, Seguins, Cancela e Sandoval) fazendo Doutoramento na UNICAMP, e o Elsen Alencar, concluindo seu Mestrado na USP. Dois recém-graduados, Antonio Boulhosa Nassar e Miguel Ayan, com bolsa do PICD/CAPES, iniciaram neste ano de 1978, respectivamente, os Mestrados, em Física na UNICAMP, e em Astronomia no Instituto Astronômico e Geofísico (IAG) da USP. Outros docentes de nosso Departamento realizam Mestrado no NCGG/UFPA.

Os meios materiais disponíveis no DF/UFPA no presente momento, como sejam, instalações, equipamentos e material bibliográfico, atendem, com algumas dificuldades, ao ensino das disciplinas de graduação ofertadas por esse Departamento.

As instalações atuais do DF/UFPA comportam apenas o Laboratório Didático, a Oficina Mecânica, a Administração do Departamento e do Colegiado do Curso de Física (2 salas) e uma sala para a instalação de professores em dedicação exclusiva.

O Laboratório Didático, adquirido por intermédio de um convênio firmado entre o CNPq, o Centro de Pesquisas Nucleares de Julich (KFA), da Alemanha Ocidental e a UFPA, em 1972, é composto de quatro partes: A – Mecânica, Calor, Óptica e Acústica; B – Eletricidade e Magnetismo; C e D – Laboratórios Especiais de Introdução à Física Moderna. As duas primeiras partes (A e B) são utilizadas em cursos para alunos da Área de Ciências Exatas e Naturais e as duas restantes (C e D), para alunos dos Cursos de Licenciatura e Bacharelado em Física, bem como, uma parte dele, o Laboratório de Microondas, está sendo utilizado por alunos do Curso de Graduação em Engenharia Elétrica. Esse Laboratório, que é apoiado por uma pequena Oficina Mecânica, atende apenas ao ensino de graduação, com poucas possibilidades de realização de pesquisa.

A disponibilidade bibliográfica específica, composta de 630 livros didáticos, 50 livros especializados e 47 títulos (4.000 fascículos) de periódicos atende precariamente ao ensino de graduação em Física e não permite uma pesquisa atuante, quer acadêmica, quer técnica. Convém salientar que uma boa parte desse material bibliográfico, principalmente de livros especializados e os periódicos, foram adquiridos através de auxílios recebidos por professores do DF/UFPA (Antonio Oliveira, Paulo Alencar e Bassalo), auxílios esses decorrentes de projetos de pesquisa financiados pelo CNPq, num total, até o momento, de Cr$ 170.000,00.

O apoio de infra-estrutura para o nosso Departamento é bastante precário, pois o mesmo dispõe de seis (6) auxiliares-técnicos e um (1) auxiliar-administrativo para atender todas as necessidades do DF/UFPA, tanto de ensino, quanto de pesquisa.

Em conseqüência da estrutura centralizada de nossa Universidade, no que concerne a parte financeira-administrativa, o DF/UFPA, ou qualquer outro Departamento da UFPA, não dispõe de verbas próprias para aquisição de material bibliográfico e nem para a contratação de pessoal técnico e nem científico. No entanto, caso alguns professores tenham projeto de pesquisa aprovado pelo Conselho Superior de Ensino e Pesquisa (CONSEP) da UFPA, o Escritório de Administração de Pesquisa (ESCAP), órgão vinculado à Sub-Reitoria de Pesquisa, Planejamento e Desenvolvimento da UFPA, poderá financiar parte desse projeto, dentro, é claro, de suas disponibilidades financeiras. Até o momento, o ESCAP concedeu auxílios da ordem de Cr$ 30.000,00 para alguns projetos de pesquisa em desenvolvimento no DF/UFPA.

A preocupação de uma política científica global para a UFPA é recente, haja visto que o primeiro documento que procura esboçar uma diretriz para o desenvolvimento da pesquisa no Pará, só surgiu em 1976 com o Programa de Pós-Graduação para a Amazônia (PROPAM), elaborado pela Sub-Reitoria de Pesquisa, Planejamento e Desenvolvimento. Nesse mesmo ano de 1976, essa Sub-Reitoria, dando continuidade ao seu objetivo de traçar uma política científica global para a UFPA apresentou o Plano Diretor de Pesquisas (PRP) a ser desenvolvido por nossa Universidade no período 1976-1979. No entanto, com relação ao desenvolvimento da pesquisa em Física no Pará, o plano é bastante carente, já que não existe, quer em seus objetivos, como em suas metas, uma posição definida com relação aos problemas cruciais amazônicos, para cuja solução, conforme vimos anteriormente, a Física deverá ter uma participação decisiva.

Ao finalizarmos este trabalho, gostaríamos de fazer as seguintes observações decorrentes do que expusemos acima:

I -Tendo em vista a situação atual do DF/UFPA e a perspectiva para o futuro, dificilmente ele poderá vir a desenvolver pesquisa acadêmica ou técnica a nível nacional (a nível internacional nem se fala pois, o próprio Brasil ainda tem algumas dificuldades nessa tarefa). O DF/UFPA poderá continuar a publicar trabalhos em revistas nacionais e internacionais, porém, o nível a que nos referimos, só será atingido quando houver reconhecimento do mesmo, por parte da comunidade científica, ou seja, quando for incorporado ao acervo bibliográfico de uso necessário.

II- A permanecer a atual estrutura do NCGG/UFPA, isto é, apenas com geofísicos, geoquímicos e geólogos, creio que será bastante difícil resolver os problemas cruciais da Amazônia, que se relacionam com essa área de pesquisa, pois conforme vimos no início deste artigo, além desses especialistas, o NCGG/UFPA deverá contar com outros, principalmente físicos, matemáticos, informáticos, químicos e engenheiros eletrônicos, para dar uma solução para tais problemas. A feitura de Teses de Mestrado ou, eventualmente, de Doutorado, não será suficiente para a solução que a Amazônia reclama para seus grandes problemas.

III – Como o desenvolvimento de uma região depende de sua capacidade de gerar Tecnologia, e esta, conforme sabemos, depende do avanço e integração entre os órgãos da UFPA capazes de formar o trinômio ciência-tecnologia-economia. Assim, creio que deverá haver uma perfeita relação entre o Centro de Ciências Exatas e Naturais (CCEN), o Centro Tecnológico (CT), o NCGG e o Núcleo de Altos Estudos da Amazônia (NAEA) (no qual há uma tentativa de seus pesquisadores no sentido de definir uma Tecnologia apropriada ao desenvolvimento da Amazônia), todos da UFPA, para que seja satisfeito um axioma básico da Teoria do Desenvolvimento, isto é: Toda Técnica deve ter suas viabilidades técnica e econômica muito bem estudadas.

IV – Em virtude da dificuldade de obtenção de verbas para pesquisa, quer através do ESCAP, do CNPq, da CAPES ou da Financiadora de Projetos (FINEP), o DF/UFPA dependerá, fundamentalmente, a partir de agora, da política científica que será traçada pela recente instituição instalada na UFPA, qual seja, a Fundação de Amparo e Desenvolvimento da Pesquisa (FADESP), ocorria no dia 7 de janeiro de 1978.

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1. Artigo publicado na Revista de Ensino de Física 1(1), p. 55-60, 1979.

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